quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Insónia

Dentro de mim, um baque assustou-me para a noite ainda escura e fria. Cega, procurei o telemóvel para ver as horas: 4h12.
Virei-me para a esquerda, de frente para a parede, fechei os olhos e... nada. A cabeça pesava-me, os pensamentos rodopiavam numa catadupa tão desenfreada que não me permitia descortinar um só. Pensava em tudo, em nada e em tudo outra vez.
Tentei focar-me numa cascata - sabia que se o fizesse, conseguiria voltar a adormecer.
Aparentemente resultou, pois cerca de uma hora mais tarde voltei a acordar da mesma forma abrupta, numa preocupação assolapante que me fazia latejar a cabeça.
Rodei sobre mim uma vez mais, encontrei a cascata da minha imaginação, mas não surtiu o efeito desejado. Virei-me para o teto, com as mãos sobre o colo, procurei pensamentos tranquilos, mas o meu coração galopava com tanta força que quase doía.
Sentei-me com uma sensação de pânico assim que a imagem desfocada dos dois abraçados surgiu diante de mim. Abri e fechei os olhos várias vezes, querendo afastá-la o mais rapidamente possível, mas continuou presa a mim, tão imponente quanto um reclame luminoso numa rua apagada.
Fui à cozinha buscar um copo com água, mais para sentir o contraste do frio da casa com o calor quase exagerado da minha cama. Dei um pequeno golo que não me satisfez e voltei a deitar-me, coberta até às orelhas, desesperada por conseguir mais umas horas de sono.
Distingui os traços nítidos do sorriso dele dirigido a ela, numa mancha disforme feita por colagens do pouco que fui vendo dela. Vi-o abraçá-la, pousar-lhe um beijo na cara enquanto ela lhe contava algo que o fazia rir. 
Não quis ver mais nada, não quis seguir nem mais um segundo da noite dele longe de mim, mas o meu pensamento traidor fugiu-me e fluiu pelos caminhos que foi escolhendo, dono de si, consciente de que estava a faltar-me ao respeito.
Vencida pelo cansaço, enfiei-me debaixo de um chuveiro quente que deixei que me massajasse as costas durante longos minutos. Os meus olhos picavam, a cabeça continuava a latejar e aquela sucessão de imagens insuportáveis continuava a pairar diante de mim, numa espécie de trailer de tormento.
Não era por passar por aquela angústia do sono quase todas as noites que me habituava a viver com o peso de um cérebro que nunca desliga e de um coração que clama por misericórdia. Os meus dias eram quase ininterruptos, entrecortados apenas por ténues pausas incapazes de colmatar a minha exaustão.
Talvez estivesse na altura de dormir uma noite inteira e acordar com forças para fazer parte do mundo.

Sem comentários: